Nutrição no desporto – dicas

A alimentação dos desportistas é cada vez mais vista pelos agentes desportivos com atenção e  reocupação. De facto, a nutrição deve ser inserida no plano de treinos com base científica no sentido de optimizar o  sucesso dos atletas. Devemos considerar o atleta como um indivíduo sujeito a gastos energéticos muito superiores aos da população geral, do que resultam exigências nutricionais específicas.

O gasto energético no desporto depende das características do atleta (sexo, composição corporal, altura, …), do exercício (frequência, intensidade e duração) e do ambiente onde este se efectua (temperatura, …).A alimentação deve satisfazer as acrescidas exigências energéticas, e como determina a disponibilidade dos substratos energéticos nos atletas, deve ser planeada de forma a contribuir para maximizar as suas reservas.

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O controlo de peso e a avaliação corporal são essenciais em desportos que consistem no transporte do corpo, como na canoagem. O excesso de peso ou proporções inadequadas de massa gorda podem ter consequências negativas na performance desportiva. Os atletas devem ainda considerar que estão  ropensos a um maior stress fisiológico e oxidativo durante o exercício, sendo a sua recuperação e preparação um dos principais objectivos da nutrição desportiva. Para o atleta, não só o tipo e quantidade de alimentos que ingere deve ser tido em conta, como também o momento em que são ingeridos. A educação é assim fundamental.

Uma incorrecta escolha alimentar pode impedir que o atleta atinja o  seu máximo potencial e até mesmo ter implicações no seu estado de saúde. Contudo, é necessário frisar que a nutrição não faz por si só  vencedores, mas pode eventualmente fazer a diferença em determinados momentos competitivos. A nutrição no desporto deve também orientar o atleta para uma alimentação saudável, prevenindo diversas patologias relacionadas com hábitos alimentares desadequados, como doenças cardiovasculares, obesidade, diabetes e vários tipos de cancro. Embora o rigor científico defina as características de um bom acompanhamento nutricional, a intervenção alimentar não deve esquecer a cultura, os gostos e o bem estar de cada um. Só desta forma a nutrição pode contribuir para o melhor sucesso dos atletas.

Nos próximos documentos, e através de uma linguagem simples e objectiva, serão abordados vários aspectos da nutrição, desde a importância de cada nutriente para o atleta às melhores escolhas alimentares no momento competitivo. Procuramos assim sensibilizar os atletas de canoagem para uma alimentação mais consciente, com base científica e que o encaminhe para um ainda maior sucesso neste desporto.

Hidratos de Carbono

– Os hidratos de carbono são compostos por moléculas simples associadas formando grandes moléculas, como o amido, ou mais pequenas, como a sacarose, o açúcar vulgar. Durante a sua digestão são  degradados nos seus constituintes mais simples  para serem absorvidos no intestino e passarem para corrente sanguínea.

– Encontram-se principalmente no pão, batata, massa, arroz e outros cereais. Outros alimentos confeccionados a partir dos cereais e adicionados de açúcar são também ricos em hidratos de carbono: cereais de pequeno-almoço, bolachas e diversos produtos de confeitaria. A fruta e as leguminosas secas como o feijão, também fornecem quantidades razoáveis de hidratos de carbono.

– Os substratos energéticos dependem fundamentalmente da intensidade do exercício. Quanto mais intenso maior é a contribuição dos hidratos de carbono. É também o único substrato metabolizado anaerobiamente, ou seja na ausência de oxigénio, que caracteriza as actividades de elevada intensidade. Assim, os hidratos de carbono têm um papel central no metabolismo energético. Como seu principal combustível, os atletas devem ter especial cuidado com a quantidade e tipo de hidratos de carbono a ingerir.

– As reservas de glicogénio muscular e no fígado estão limitadas a cerca de 500g. Por isso é importante que o atleta tenha cuidados especiais com a ingestão antes, durante e após o exercício, especialmente se tem uma duração superior a 1 hora e de intensidade média/elevada. – A quantidade, qualidade e momento em que são ingeridos também pode determinar uma boa ou má reposição de glicogénio muscular, sendo estes factores ainda mais preponderantes quando os intervalos entre os treinos e competições são curtos.

Os alimentos fornecedores de hidratos de carbono podem ser classificados tendo em conta a velocidade com que são absorvidos no sangue, ou seja, a glicose chega ao sangue:

Elevado índice glicémico (IG) – Os hidratos de carbono destes alimentos entram rapidamente no sangue provocando um pico de insulina. A insulina é uma hormona secretada pelo organismo com função de armazenar os açúcares que chegam ao sangue vindos da digestão. São alimentos indicados para a reposição rápida de energia, por exemplo durante ou imediatamente após o treino.

 Baixo índice glicémico (IG) – os hidratos de carbono nestes alimentos demoram mais tempo a entrar na circulação sanguínea. São mais indicados antes de um treino para que não ocorra elevado aumento de insulina. Este aumento de insulina dificulta a saída da glicose das reservas de glicogénio hepático (fígado) para ser usada nos músculos em actividade. Os alimentos com baixo IG, ao contrário dos com elevado IG, diminuem a fome, promovem a saciedade, melhoram o controlo do peso e o perfil lipídico.

 

 

– A deficiente ingestão de hidratos de carbono antes e durante o treino/competição contribui para que as reservas de energia se esgotem mais rapidamente, contribuindo para a instalação precoce de estados de fadiga.

– Uma boa reposição de hidratos de carbono na hora seguinte após o treino é fundamental. Permite uma recuperação mais rápida e em maior quantidade do glicogénio muscular e hepático o que significa um melhor preparação para o treino seguinte. Desta forma, influencia a performance do atleta.

– Os atletas devem consumir habitualmente alimentos ricos em hidratos de carbono (5-10g/kg/dia), contribuindo para cerca de 60% do valor calórico total diário da sua alimentação. Estas recomendações não são geralmente conseguidas mas são necessárias que aconteça a maximização das reservas de glicogénio e energia. A quantidade específica de hidratos de carbono a ingerir depende pois do tempo e intensidade dos treinos.

– Nas suas escolhas alimentares, o atleta deve ver os alimentos fornecedores deste nutriente não como acompanhamento mas como o centro das refeições.

Proteínas

– As proteínas desempenham diferentes funções no organismo humano. De interesse para o atleta, destaca-se a sua importância na construção de massa muscular, na recuperação de microlesões celulares e a sua ligeiramente maior contribuição como substrato energético durante o exercício de endurance.

– São nutrientes que existem especialmente na carne, peixe, leite, iogurte, queijo leguminosas secas e ovos. O atleta deve preferir as opções magras destes alimentos.

– Contrariamente ao que muitos atletas possam pensar, a maior ingestão de proteínas não leva por si só a um aumento de massa muscular. O excesso de proteínas no organismo é oxidado e eliminado pela urina.

– Embora as necessidades de um atleta sejam ligeiramente superiores às de um indivíduo sedentário, uma alimentação inserida no nosso padrão cultural, fornece as adequadas quantidades de proteínas. Para um atleta de endurance recomenda-se 1,2-1,5g/kg/dia.

– É importante que o atleta tenha uma alimentação rica em hidratos de carbono pois na sua falta as proteínas serão usadas como fonte de energia em vez de ajudarem a constituir a massa muscular. Atletas em risco de ingestão inadequada de proteínas são os que restringem a ingestão energética ou a variedade alimentar (ex: vegetarianos).

– A suplementação com proteínas não é recomendada. O excesso de ingestão proteica pode levar à desidratação, perda urinária de cálcio, ganho de peso e stress para os rins e fígado a longo prazo.

Gorduras

– Embora os hidratos de carbono sejam a principal fonte de energia em exercícios de intensidade elevada, a gordura é o mais importante combustível em actividades de intensidade ligeira a moderada.

– Os atletas devem consumir entre 20-30% de energia provenientes das gorduras. Uma alimentação pobre em gordura e alta em hidratos de carbono é também importante por razões de saúde, porque diminui o risco de doença cardiovascular, obesidade, diabetes e alguns tipos de cancro.

– Estas doenças estão relacionadas com o consumo exagerado de gordura, principalmente saturada proveniente das carnes vermelhas, enchidos, fumados, fritos, produtos de pastelaria, confeitaria, e a um consumo deficiente de gordura insaturada proveniente do azeite, soja, frutos gordos (noz, amêndoa, …) e peixes como o salmão, sardinha e atum.

– O atleta deve ainda ter um cuidado especial com a ingestão excessiva de gorduras antes de um treino ou competição pois podem provocar problemas gastrointestinais e privar uma adequada ingestão de hidratos de carbono.

Fibras

– As fibras existem essencialmente nos cereais integrais, frutas, hortaliças e legumes. Uma boa ingestão diária destes produtos favorece o trânsito intestinal e, a longo prazo, contribuem para a prevenção de diversas formas de cancro.

– As fibras são também importantes moduladores da absorção, ajudando a controlar o índice glicémico e a inibir a absorção de colesterol.

– O atleta deve escolher alimentos ricos em fibras no seu dia a dia – legumes, frutas e cereais integrais. Contudo, nas refeições que antecedem a competição deve restringir o seu consumo pelo desconforto gastrointestinal que possam causar.

Vitaminas

– Embora não sejam nutrientes energéticos, as vitaminas são extremamente importantes na capacidade funcional do corpo humano, intervindo em diversas reacções metabólicas que ajudam na defesa e protecção do organismo contra o stress causado pelo exercício.

– Uma alimentação variada e rica em fruta, legumes e hortaliças fornece já as quantidades adequadas de vitaminas, sem que haja consequências negativas para a saúde do atleta.

– A suplementação pode ser um importante suporte e apoio para os atletas expostos a um mau padrão alimentar. Parece trazer benefícios para a sua saúde e performance apenas em situações de correcção de alguma deficiência vitamínica. – Embora os níveis de toxicidade de vitaminas seja difícil de alcançar com ingestão de alimentos, o atleta deve ser educado e motivado para uma correcta escolha alimentar em vez de ser direccionado para a suplementação pois aumentará o risco de toxicidade.

Minerais

– Uma alimentação saudável e equilibrada pode fornecer as doses recomendadas de minerais para os atletas.

– Contudo, as mulheres atletas e em especial as que fazem restrição alimentar podem não ingerir suficientes quantidades de cálcio e ferro. Juntamente com o stress fisiológico a que estão submetidas devido à intensidade dos treinos, estas atletas têm elevados riscos de osteoporose, anemia e distúrbios hormonais e menstruais.

– As atletas femininas devem ter especiais cuidados com a sua alimentação procurando os alimentos que forneçam estes minerais. O ferro encontra-se essencialmente na carne, peixe e cereais fortificados. A principal fonte de cálcio é o leite e seus equivalentes.

– Se necessário, as atletas devem recorrer à suplementação destes minerais.

Ergogénicos

A principal preocupação relativamente à nutrição deve ser corrigir os erros  alimentares e adaptar uma boa alimentação ao dia a dia do atleta retirando daí os benefícios para a sua saúde e performance. Os ergogénicos devem ser entendidos como ajustamento de detalhes. Não faz sentido que o atleta se apoie nestas substâncias sem ter criado um regime alimentar correcto, já que é aí que reside o sucesso da nutrição no desporto. De seguida são descritas algumas substâncias que têm tido resultados significativos na performance desportiva.

Cafeína

É um estimulante natural que existe em produtos como o café, o chá e o guaraná. Intervém a nível do sistema nervoso e as suas propriedades excitantes afectam o estado de vigilância e tempo de reacção do atleta. Além disso, é em exercícios de longa duração que as suas propriedades são mais relevantes pelo aumento da disponibilidade de ácidos gordos livres (gordura) para o metabolismo energético, poupando glicogénio muscular e retardando a fadiga. Devido a esta propriedade, muitos atletas usam a cafeína para emagrecimento.

De salientar, também, que a sua constante utilização induz habituação, ocorrendo a diminuição dos seus efeitos benéficos como excitante.

Creatina

A creatina é um dos suplementos mais conhecidos e procurados pelos atletas. Contudo, apenas parece ter efeitos benéficos na performance de um atleta em exercícios de elevada intensidade e curta duração (menos de 30s) executados repetidamente, não representando, pois, importância para competições longas. Deve ter-se em consideração que a toma de suplementos de creatina resulta num aumento de peso (metade em água, metade em massa muscular) podendo ser prejudicial em desportos que dependam do transporte do corpo.

Bicarbonato

O bicarbonato pode melhorar a performance em exercícios intensos e com duração aproximada de 1-5 minutos pois a energia utilizada provém principalmente da via anaeróbia, isto é, na ausência de oxigénio.

A via anaeróbia pode levar à acumulação excessiva de ácido láctico nas células. Assim, ao não ser removido, causa fadiga muscular o que prejudica a performance dos atletas.

O bicarbonato é uma substância alcalina que ajuda a neutralizar o ácido láctico. Desta forma, o estado de fadiga demora mais tempo a instalar-se, o que representa importantes implicações no rendimento do atleta.

Contudo, a ingestão de bicarbonato deve ter considerações especiais, pois pode causar problemas gastrointestinais, vómitos e diarreia.