Por mais fraco que seja o nível atlético do praticante de corrida, ele terá sempre grande curiosidade em conhecer quais serão os seus limites no futuro, mesmo que este seja mais ou menos imediato. Ao treinar, ao “afinar” o seu corpo, ao aprender novas técnicas de melhoria de Forma, e mesmo que isso não seja o seu grande objectivo, o desportista está a descobrir novas áreas e ritmos de deslocação e, inevitavelmente, acaba por formular uma pergunta bem pertinente: até que ponto posso chegar?
Todo o corredor gostaria de saber qual o resultado que poderia alcançar numa determinada competição em que pensa alinhar. A expectativa em torno de um tempo que represente a melhor marca pessoal é comum a todos os corredores que se dedicam com seriedade ao treino regular e diário. Obter o melhor resultado numa competição importante não é algo misterioso, nem sequer encerra algo de místico quando se pretende prever determinado tempo para concluir uma certa distância.
Assim, o nosso objectivo é estabelecer uma maneira simples e eficiente para que possamos prognosticar o desempenho em prova de maratona ou estipular o tempo base que deve ser alcançado em determinada distância e que servirá como referência para a previsão do resultado após se correr 42 km.
Para o prognóstico de um desempenho atlético, contamos com o auxílio das Ciências do Desporto e dos cálculos matemáticos. A matemática, como ciência exacta, permite–nos a previsão do resultado do corredor, baseando-nos em desempenhos obtidos noutras distâncias. Esses cálculos, ao contrário do que O MÉTODO DE CÁLCULO muitos poderiam supor, são simples, aproximando de forma convincente o resultado esperado do resultado real.
Embora os cálculos matemáticos sejam exactos, o corpo humano não se resume a pura matemática, sendo os mecanismos fisiológicos que ditam as regras a serem adoptadas para determinadas situações de stress físico e emocional, bem características das provas de longas distâncias. Por isso, os meios utilizados para o prognóstico do desempenho atlético nas corridas de fundo servem apenas como um referencial para a determinação do possível resultado competitivo.
Entretanto, com o prognóstico do resultado em mãos, ou seja, com o conhecimento teórico das suas possibilidades durante a prova, é possível, ao treinador e até ao próprio atleta, a elaboração de uma estratégia de corrida que lhe favoreça a obtenção do melhor resultado. Assim, o atleta não correrá o risco desnecessário de abandonar a disputa precocemente devido ao aparecimento da fadiga, uma consequência directa da exposição a um stress físico e emocional insuportável para essa situação.
método cálculo
O método proposto para o cálculo do prognóstico do resultado competitivo numa dada distância de corrida, fundamenta-se em princípios teóricos elaborados na antiga “Escola Socialista”. É do conhecimento de todos as inúmeras pesquisas desenvolvidas na antiga União Soviética e a sua contribuição para o surgimento de uma sólida ciência do desporto.
Fundamentado nesse conhecimento, buscamos as condições necessárias para calcularmos o resultado previsto a partir das expectativas e dos objectivos de cada atleta. Para isso, uma breve revisão dos resultados competitivos dos nossos atletas foi necessária, pois, a partir daí, estabelecemos um critério seguro como base de cálculo e que denominaremos como norma técnica.
Aquilo a que chamamos de norma técnica, deverá ser entendida como a dimensão em que se limita o resultado competitivo e é uma referência de base para a construção do desempenho atlético, servindo assim para que o treinador e o atleta tenham controlo sobre a aplicação dos meios e métodos de preparação desportiva, distribuindo-os de forma eficiente ao longo das etapas do treino para que se possa alcançar os objectivos pretendidos.
Determinamos a norma técnica a partir da observação dos resultados competitivos dos atletas brasileiros desde 1997 até 2001 e de acordo com o ranking elaborado pela CBA. Ao estabelecermos uma norma técnica temos um padrão de referência para a excelência nas corridas de fundo no nosso país.
Isto significa que todo o atleta de corrida de longa distância terá um referencial capaz de lhe indicar o nível desportivo a ser alcançado no Brasil, permitindo o direccionamento para objectivos concorrentes com a realidade nacional. A conclusão dessa pesquisa, breve e muito simples, conduziu-nos ao seguinte padrão de excelência desportiva nacional para as provas de fundo, tendo a maratona como centro da nossa atenção:
Prova | Tempo | Velocidade | Coeficiencia Media |
Maratona | 02:13:59 | 5,25 m/s | 100 |
Meia Maratona | 01:04:59 | 5,41 m/s | 103/97 |
15 Km | 45,29 | 4,4 m/s | 104/96 |
10 Km | 29,29 | 5,65 m/s | 107/93 |
As distâncias seleccionadas apresentam uma óptima relação com a Maratona, a nossa prova-alvo ou distância padrão. O tempo de cada competição foi estabelecido através da análise do resultado dos nossos melhores atletas tanto em provas nacionais como internacionais, conforme o ranking da CBA.
Isto é importante, pois os nossos corredores de elite há muito que realizam um excelente trabalho fora das nossas fronteiras, fruto não apenas do talento natural e da dedicação e perseverança desses atletas, mas também da grande capacidade apresentada pelos nossos técnicos na elaboração de programas de treino cada vez mais fundamentados pelo conhecimento científico. Acredito que até podemos discutir sobre uma “Escola Brasileira” de técnicos de corridas de fundo.
A velocidade, dada em metros por segundo (m/s), é utilizada como base de cálculo do coeficiente de correlação. Este coeficiente retrata a relação existente entre a distância padrão, neste caso a Maratona, e uma outra distância específica que será utilizada para prognóstico do resultado da distância padrão. Esse coeficiente de correlação é a norma técnica que será utilizada para calcular o futuro desempenho competitivo.
O cálculo do coeficiente de correlação (CC) pode ser efectuado de duas maneiras:
- 1o CC = velocidade da distância padrão/velocidade da distância específica
- 2o CC = velocidade da distância específica/velocidade da distância padrão
O primeiro cálculo é utilizado quando, na posse do resultado da distância específica (Meia Maratona, 15 km e 10 km), se pretende prever o resultado que poderá ser alcançado na Maratona.
Já na segunda situação, o objectivo é estabelecer qual o tempo-base que devemos alcançar nas distâncias específicas (Meia-Maratona, 15 km e 10 km) para podermos vir a atingir determinado resultado na distância padrão, Maratona.
Essas operações, entretanto, já foram realizadas para facilitar o trabalho do técnico e do atleta. O que iremos utilizar nos nossos cálculos são as normas técnicas. Aqui, entretanto, cabe uma explicação:
→ Os índices maiores (103, 104 e 107) serão utilizados para calcular o tempo–base da distância específica;
→ Os índices menores (97, 96 e 93) serão para o prognóstico do desempenho na chamada distância padrão.
Toda essa teoria pode-nos causar um certo pânico, sobretudo numa fase inicial dos cálculos, mas a sua aplicação prática é muito simples. Observem estes dois exemplos:
1. Situação: atleta que pretende vir a obter uma marca de 2h30 na sua próxima Maratona.
Nesta sequência, para que esse atleta possa alcançar a marca desejada, é necessário que apresente um desempenho compatível nas distâncias menores (10 km, 15 km e Meia-Maratona). Não sabemos quais são os seus tempos base nas referidas distâncias, mas podemos calculá-los conforme se poderá observar:
Velocidade média da distância padrão (Maratona em 2h30) = 4,68 m/s
para calcular o tempo base nos 10 km /
- CC = 107×4,68/100 /
- CC = 5,00 Tempo base = 10.000/5,00
- 10 km = 33’20”
para calcular o tempo base nos 15 km:
- CC = 104×4,68/100
- CC = 4,86 m/s
- Tempo base = 15.000/4,86
- 15 km = 51’26”
para calcular o tempo base na Meia Maratona:
- CC = 103×4,68/100
- CC = 4,82 m/s
- Tempo base = 21.000/4,82
- Meia Maratona = 1h12.57
O atleta deve apresentar, portanto, um referencial nas distâncias específicas equivalente a:
10 Km | 33,2 |
15 Km | 51,26 |
21,1 Km | 01:12,6 |
- Situação: atleta que deseja saber o resultado (prognóstico) da sua próxima Maratona, sendo detentor de marca de 1h25 na distância de Meia Maratona.
A partir da sua melhor marca na Meia, é possível a esse atleta prever o desempenho na Maratona. Se o mesmo apenas tivesse como referência o resultado na distância de 10 ou 15 km, também seria possível a previsão do desempenho. Acompanhe os passos para avaliação destes dados:
Velocidade média da distância específica (Meia Maratona em 1h25) = 4,13 m/s (Nota da Redacção: para aprender a calcular a velocidade média veja o quadro em anexo publicado neste artigo).
Como fazer o prognóstico para o tempo previsto na Maratona:
- CC = 97×4,13/100
- CC = 4,00 m/s
- Tempo-base = 42.195/4,00
- Maratona = 2h55.48
Portanto, e de acordo com os cálculos de prognóstico, um atleta detentor da marca de 1h25 na distância de Meia Maratona teria condições teóricas de completar a Maratona num tempo de 2h55.48.
OUTROS FACTORES QUE AFECTAM OS RESULTADOS
Entretanto, sabemos que, na prática, as coisas não funcionam tão correctas como possa fazer supor a lógica dos cálculos. O resultado competitivo é constituído ao longo de uma sólida preparação física, técnica, táctica e psicológica.
Outros factores, como o estado de saúde, a alimentação, o descanso, os conflitos sociais, além das condições do ambiente (temperatura, humidade relativa do ar, relevo do percurso), a conduta durante a prova (hidratação e suplementação) e, claro, a motivação, exercem influência decisiva sobre o desempenho atlético.
CÁLCULO DA VELOCIDADE MÉDIA |
Para calcularmos a velocidade média de deslocamento, isto é, o ritmo em que o corredor pretende competir, siga o seguinte modelo de cálculos: |
Tempo da prova de 10 km, por exemplo, 38’40” |
Transformar o tempo previsto em segundos: |
(60×38)+40=2.320 segundos |
Transformar 10 km em metros: |
10×1.000 = 10.000 metros |
Velocidade média: |
10.000m /2.320 seg = 4,31 m/s |
Como se deve compreender, se a distância fosse outra o procedimento dos cálculos seria o mesmo. |
Devido a esses factores, uma margem de 1% para melhor (melhor resultado) e 2% para mais (pior resultado) pode ser adoptada como conduta satisfatória para o calculo final da previsão do desempenho. Ao estabelecermos estes parâmetros, o prognóstico do resultado competitivo torna-se mais confiável.
Assim, teríamos a seguinte situação em relação ao atleta que sugerimos para o nosso segundo exemplo :
- Velocidade média optimista = 4,00×1,01 (1%) = 4,04 m/s
- Velocidade média pessimista = 4,00×0,98 (2%) = 3,92 m/s
- Tempo base (Maratona) = 2:55.48 Expectativa alta = 2:54.04
- Expectativa baixa = 2:59.24
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES FINAIS
A metodologia aqui apresentada é uma forma para podermos determinar metas realistas e adoptarmos condutas compatíveis com os nossos objectivos.
Não pretendemos entrar no mérito das questões técnico-pedagógicas que cada profissional utiliza recurso fundamental de seu trabalho como quotidiano.
Cabe aos técnicos e atletas procurar, através de todos os recursos existentes, uma busca incansável pela excelência desportiva.
Em a relação às normas técnicas aqui apresentadas, estamos à disposição para críticas e sugestões de outros profissionais que queiram contribuir para a evolução do conhecimento nas provas de fundo. ■